Ipueirense é a primeira indígena a publicar livros em cordel no Brasil



Os versos da cearense Auritha Tabajara estão prestes a morar na maior biblioteca do mundo. De Ipueiras (a 300 Km de Fortaleza) a Washington, D.C, nos Estados Unidos, a primeira mulher indígena a publicar livros em cordel no Brasil terá a trajetória literária preservada e reconhecida pela instituição Library of Congress (Biblioteca do Congresso).

A obra “Coração na aldeia, pés no mundo” (2018), com xilogravuras de Regina Drozina, e os folhetos “A sagrada pedra encantada” (2019) e “Diário de uma índia nordestina” (2019) foram doados pela autora, na última quarta-feira (8), para compor o acervo internacional.

Auritha foi localizada pela representante bibliográfica da Biblioteca do Congresso dos EUA, Magaly Pedroso, por meio de um perfil biográfico publicado em março deste ano no Diário do Nordeste. Nas pesquisas rotineiras que realiza em busca de cordelistas, a bibliotecária paulista se viu atraída pelo trabalho da cearense, inclusive pelo pioneirismo a ele atribuído.

“Na mesma hora, ela perguntou onde eu estava e disse que ia me ver. Uma pessoa maravilhosa, que eu gostei muito de conhecer. Ela me explicou direitinho o processo de envio das minhas obras aos Estados Unidos! Estou ficando chique!”, brincou Auritha ao telefone, antes de começar as gravações do documentário biográfico “A Mulher sem Chão”, com estreia prevista para 2022.

ACERVO BRASILEIRO DE CORDÉIS

De São Paulo, os cordéis de Auritha seguem primeiro para o Escritório da Biblioteca do Congresso, no Rio de Janeiro. Em atividade desde 1966, o espaço é responsável atualmente pela coleta de materiais do Brasil, Uruguai, Suriname, Guiana e Guiana Francesa. Após essa breve parada, onde também deve ser analisada por uma bibliotecária especializada neste tipo de literatura, a obra da autora cearense será enviada para os EUA.

É um presente conhecer Auritha e estar próximo de pessoas como ela, que estão se lançando, produzindo, mesmo com as dificuldades de reconhecimento no Brasil”, relata a representante bibliográfica Magaly Pedroso, há doze anos vinculada à instituição norte-americana.

Com mais de 155 milhões de itens – livros, manuscritos, jornais, revistas, mapas, vídeos e gravações de áudio -, incluindo materiais disponíveis em 470 idiomas, a Biblioteca do Congresso está localizada em três edifícios, na capital dos Estados Unidos, e ganhou o título de maior do mundo tanto pelo espaço de armazenagem como pelo número de obras. Segundo a instituição, o acervo de “livrinhos brasileiros” do American Folklife Center (AFC) foi criado na década de 1970, com a aquisição da coleção Sol Biderman. O escritório do Rio e a Divisão Hispânica em Washington trabalharam com a AFC nos últimos 40 anos para transformar esta seleção básica em uma das maiores do mundo, compreendendo mais de 11 mil itens, alguns já na década de 1930.

Contabiliza-se, anualmente, a seleção de 300 a 600 “livrinhos”, adquiridos em viagens de campo aos estados do Nordeste e Norte do Brasil, feiras do livro e visitas a autores (cordelistas) e associações de cordel.

Mas, até agora, Auritha Tabajara não constava nesta lista.

Aliás, a cearense já aproveitou a oportunidade do primeiro encontro para entregar, junto com o próprio trabalho, o cordel da filha, Ana Jasly, intitulado “Kunhataim Tabajara em São Paulo” (2020).

Ficou para uma outra ocasião a entrega do livro de estreia de Auritha, “Magistério Indígena em versos e poesia” (2007), que já foi considerado leitura obrigatória nas escolas públicas pelo Estado do Ceará, mas hoje se encontra esgotado.

A conquista é celebrada pela cordelista em nome de toda a família Tabajara.

“Significa muito meu livro estar indo para a biblioteca de outro país! Me sinto janelas abertas para a voz de outras mulheres. Um orgulho para minha avó, ela se sente representada. Estou mega feliz por essa conquista. Lógico que temos ainda muito o que conquistar. Por ser uma mulher indígena, nordestina e lésbica, é muito complicado estar nos espaços”, reforça, trazendo todas essas experiências em sua poesia.

Por Diário do Nordeste

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